O diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), Clemente Ganz Lúcio, provocou o 2º Congresso da Intersindical com reflexões sobre os impactos da atual reestruturação produtiva do capitalismo (quarta revolução industrial) na atividade sindical. Ele enfatizou a introdução de novas tecnologias no mundo do trabalho, que, em vez de beneficiar os trabalhadores, eliminam postos de trabalho, precarizam as formas de contratação e aumentam os lucros dos grandes capitalistas e investidores do sistema financeiro. Para o diretor do DIEESE, se os sindicatos não incorporarem as novas demandas da classe trabalhadora que surge dessa reestruturação, estarão condenados a definhar e desaparecer.
Para exemplificar, Clemente Fanz falou sobre o setor do telemarketing. Hoje, segundo ele, um atendente custa cerca de R$ 5 mil ao mês para o empresário, considerando encargos e demais despesas. Uma firma com 100 empregados teria um custo hipotético de R$ 500 mil mensais. Com a substituição dos funcionários pelo atendimento automatizado por programas de computador (que já está acontecendo), o custo cairia brutalmente: R$ 250 ao mês. Resultado: demissões massivas e lucros exorbitantes para os acionistas que controlam a empresa.
Foi para lidar com situações como essa que foi elaborada e aprovada a reforma trabalhista no Brasil, que alivia os passivos sobre as demissões e passa a permitir a contratação intermitente. Soma-se à reforma a total permissividade para a terceirização, seja no setor público ou privado. “De 2008 para cá, 110 países fizeram 642 reformas trabalhistas para gerar esse resultado. Empresas impuseram isso no mundo todo: flexibilidade e fim dos passivos trabalhistas”, informou o diretor do DIEESE.
Há uma diferença sobre o destino dos lucros, que altera o próprio sentido das empresas no novo cenário econômico. “O capitalista antigo ficava com 25% dos lucros e reinvestia os outros 75%. A empresa crescia e os trabalhadores lutavam para ficar com parte do aumento da produção, reajustando seus salários, fazendo greves quando fosse necessário. Agora, os investidores esperam ficar ricos rapidamente, com o maior retorno no menor tempo possível. Não usa lucro para empresa crescer. A razão é inversa: 25% para investimento e 75% para divisão entre os acionistas. E, nesse modelo, o sindicato é empurrado para fora do jogo”. O resultado é menos empregos e menor crescimento econômico, em favor de maior concentração de renda, com cada vez mais bilionários no mundo.
“Nos próximos anos teremos o primeiro trilionário da história”, alertou Clemente Ganz. Para se ter uma ideia, este sujeito poderia gastar US$ 1 milhão por dia por 2.578 anos. “É o sistema que estão criando, esse tipo de concentração de riqueza”, o que significa que “estamos perdendo de goleada”, afirmou Ganz.
O perfil da classe trabalhadora se altera com a estrutura econômica. A tendência, agora, é de cada vez mais trabalhadores sem vínculo formal empregatício, que hoje já não são nem metade da população economicamente ativa. “Se nossa proposta não for para representar o total dos 105 milhões de trabalhadores, perdemos o rumo da história. Temos que alcançar o motorista de Uber, o PJ [pessoa jurídica], o autônomo. Nenhum destes está na base sindical e todos são trabalhadores”, destacou Clemente Ganz. “Precisa haver um esforço para conectar a estrutura sindical a essa mudança. O sindicato deve estar colado ao mundo do trabalho e representar esses novos trabalhadores. Não temos alternativa a não ser fazermos uma profunda mudança na organização sindical”, convocou o diretor do DIEESE.
O recado de Ganz foi direto às gerações mais velhas: “ou damos espaço para as pessoas que estão nesse mundo ou vamos definhar dia após dia. Ou os jovens tomam sindicato ou sindicato acaba. Temos que pegar as novas pautas concretas e fazer a luta”. “Se não pensarmos esses desafios, vamos ficar olhando pelo retrovisor quando há um paredão a nossa frente. Precisamos inventar o novo mundo sindical para o novo mundo do trabalho”, sintetizou.
Texto: Matheus Lobo
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