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Herbert Anjos | Conservadorismo Redivivo

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Herbert Anjos é mestre em história pela UnB, professor e militante da Intersindical – Central da Classe Trabalhadora

A polarização político-ideológica que o país vive tem atingido inédita amplitude no pós- redemocratização. Nas ruas e nas redes sociais, progressistas e conservadores das mais variadas tonalidades têm se digladiado. Lamentavelmente, são as ideias e movimentos de natureza conservadora, forças que sempre existiram, mas que outrora atuavam de maneira recôndita e envergonhada, que têm ganhado espaço e galvanizado corações e mentes de milhares na sociedade brasileira. Questionamentos sobre a legitimidade de nossa (limitada) democracia, sobre a relevância dos direitos humanos, hostilidade aos movimentos sociais organizados e a repulsa aos exíguos avanços sociais que tivemos no período recente se tornaram frequentes, tornando claro a reemergência de uma onda reacionária presente em ações e discursos.

Esse fenômeno não é exclusivamente nacional. Em vários países da América Latina, em especial na Venezuela e na Argentina, vemos a recomposição de forças conservadoras contando, inclusive, com sólida rede de apoio internacional. Na Europa, a crise do Estado de Bem Estar Social gera desemprego e a xenofobia, direcionada às ondas de imigrantes, dá fôlego para alternativas de extrema direita se enraizarem socialmente e crescerem politicamente em vários países.

Há vários elementos que podem ser reunidos para explicar esse regresso das direitas na política brasileira: a interrupção das condições materiais – fim do boom de commodities – que garantiam o lastro do projeto político “lulista” e os consequentes ataques, com apoio do governo federal – das frações hegemônicas das burguesias aos direitos sociais, trabalhistas e das minorias em um momento de conflito redistributivo; o rebaixamento programático, ideológico, político e identitário das esquerdas que se organizavam dentro ou em torno do PT; a recomposição do campo conservador – seja através do PSDB e seus congêneres ou de organizações e novos movimentos mais à direita; a ação monopólio das comunicações, responsável por bombardear diariamente setores de classe média tradicional e os segmentos sociais que ascenderam socialmente nos últimos anos e construíram a hegemonia de um discurso conservador, privatista e falso moralista; a crescente influência das igrejas neopentecostais, do conservadorismo de costumes e de seu trabalho de base–conceito conhecido das esquerdas – entre os setores mais precarizados e socialmente vulneráveis.

Como objetivo estratégico dessa reorganização conservadora essas forças ambicionam a interrupção das limitadas conquistas sociais recentes, realidade que a política econômica recessiva do Governo Dilma (PT) já faz desaparecer e, se possível, mudanças mais profundas, de caráter político-institucional – que culminem na extinção de vários direitos garantidos pelo ordenamento constitucional de 1988.

A PEC 215, a lei que amplia as terceirizações, a proposta de uma “reforma” da previdência e a redução da maioridade penal são expressões claras da lógica contra reformista atuante.Combinando novas e velhas formas de luta, novos discursos e lideranças com velhas demandas e objetivos revitalizados, as direitas renovadas, turbinadas pelo vultoso financiamento empresarial de campanha, ganham espaços no Parlamento e nas ruas.

A julgar pelo crescimento das bancadas conservadoras e/ou representantes de interesses monopolistas no Congresso e pelo reacionarismo de alguns movimentos, que saíram às ruas neste ano, podemos afirmar que a lógica da “guerra de posições” tão cara às esquerdas foi bem assimilada por este campo político. Impacientes, alguns setores já pretendem adotar a “guerra de movimento” na tentativa de emplacar um impeachment com razões jurídico-políticas duvidosas.

Interessa às esquerdas analisar os fundamentos do processo em curso e, principalmente, adotar táticas corretas para o enfrentamento ao cenário político desfavorável que se apresenta. Em especial, àquelas esquerdas que estiveram direta ou indiretamente vinculadas ao projeto que governa o Brasil desde 2003.

Se estas, no intuito de combater o conservadorismo reinante, adotarem a lógica do “mal menor”, que implica na defesa do governo e de suas escolhas, ou continuarem com uma avaliação condescendente em relação ao projeto implantado pelos governos petistas – projeto este que nunca considerou, de forma sincera, politizar minimamente amplos setores para uma perspectiva democrática e popular de reformas estruturais – a derrota será inevitável. E com desastrosas e duradouras consequências para o conjunto da classe trabalhadora brasileira.

Não é hora de hesitação. O momento deve ser de reencontro das esquerdas com seus valores e aspirações essenciais: a justiça social, a perspectiva de um reformismo radical, a ampliação da democracia, a defesa intransigente das minorias e de uma sociedade sem opressão, discriminação e exploração. E com a crítica adequada e sincera dos caminhos escolhidos na última década. Ainda mais em um contexto de ajuste fiscal regressivo que joga os custos da crise fiscal nas costas das classes trabalhadoras e populares.A conciliação da última década embaralhou a identidade progressista. Somente um programa claro, à esquerda, que aponte saídas e faça correta mediação com a realidade écapaz de separar o “joio do trigo” e tornar o avanço conservador uma “onda”, isto é, um fenômeno repentino que em seguida desvaneça sem deixar maiores rastros.

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