Quem é contra a corrupção e está atento à insistente informação midiática acerca da operação Lava Jato deve ter observado a quantidade de terceirizações e quarteirizações diretamente envolvidas no desvio de dinheiro público. O tema da terceirização está, portanto, mais próximo de nós – de todos nós – do que podemos imaginar.
A operação Lava Jato investiga um esquema de superfaturamento de contratos da Petrobrás para pagamento de propina a agentes públicos e privados. A burocracia e a possibilidade de contratação de empresas privadas (a terceirização) é um dos caminhos principais para permitir tais atos de corrupção.
A terceirização, portanto, está diretamente relacionada ao discurso contra corrupção, que vem animando manifestações pelo país. A administração pública é o empregador que mais terceiriza no país. Ao fazê-lo, burla a norma de contratação por meio de concurso público. A recente decisão do STF na ADI 1923 permite à administração pública, direta e indireta, contratar pessoas por meio de Organizações Sociais, mesmo em tribunais, hospitais e escolas.
A prática de contratar empresas, para contratar pessoas, em lugar de contratá-las diretamente, por meio de certame público, potencializa as possibilidades de desvio de dinheiro público, cria procedimentos desnecessários e burocratiza a prestação de serviço público. O PLC 30 amplia ainda mais as possibilidades de repasse de força de trabalho, estimulando a corrupção tanto em âmbito público quanto privado.
A chamada Agenda Brasil, anunciada recentemente, inclui a terceirização e, portanto, a aprovação do PLC 30/2015, no rol de prioridades dos poderes de Estado. E, ao que parece, pela movimentação do Congresso para a inclusão em regime de urgência, a terceirização figura realmente como o verdadeiro principal objetivo da articulação que se desenha no panorama político do país.
Muito já foi dito contra a terceirização: reduz salários, distancia o trabalhador do verdadeiro beneficiário do trabalho, potencializa o número de acidentes, reduz as contribuições previdenciárias e fiscais, facilita a exploração do trabalho infantil ou em condição análoga à de escravo. Resta o que ainda precisa ser dito: está diretamente relacionada às últimas notícias de corrupção no país.
O discurso que rechaça a corrupção, vestindo-se das cores do Brasil para pedir maior compromisso com a coisa pública, precisa urgentemente perceber que a agenda da terceirização está na contramão também das suas prioridades. Para além das diferenças político-partidárias, portanto, existe uma agenda comum, que repele a institucionalização da corrupção e que, por consequência, precisa repelir fortemente qualquer tentativa de regulamentação da terceirização nas relações de trabalho.
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*Valdete Souto Severo – Juíza do trabalho no Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região. Especialista em Direito do Trabalho, Processo do Trabalho e Direito Previdenciário pela UNISC, Master em Direito do Trabalho, Direito Sindical e Previdência Social, pela Universidade Européia de Roma – UER (Itália), Doutora em Direito do Trabalho pela USP/SP. Diretora da FEMARGS – Fundação Escola da Magistratura do Trabalho do RS.
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Douglas Dickel disse:
Discordo, apenas, que o “combate à corrupção” seja incompatível com o apoio à terceirização. Ambas as campanhas foram induzidas pela mídia, para benefício de seus sócios, os grandes empresários. Por parte dos “manifestantes”, o objetivo de “combater a corrupção” é/era afastar do poder os políticos mais ligados aos pobres, da mesma forma que o apoio à terceirização também é um movimento na direção da manutenção das desigualdades sociais e da concentração de renda.