As consequências econômicas do ajuste estão à vista de todos: desaceleração, contração, queda do PIB, desmantelamento de parcelas importantes do Estado, privatização, penalização dos mais pobres e a perenização do país como centro de valoração financeira.
Mas há outra decorrência pouco falada nesses dias de tratamento de choque, imposto ao país pelo governo petista em aliança com o capital financeiro e a grande mídia.
Trata-se da desqualificação da democracia.
NÃO ERAM PARA VALER – O pacote evidencia que as eleições de 2014 não eram para valer. Que não havia dois projetos em jogo, como cínicos e espertos, montados em milionárias máquinas de marketing, difundiram ao distinto público. Era tudo de mentirinha.
Ganhasse quem ganhasse, o programa a ser aplicado seria um só: o da banca e do capital financeiro. Ou seja, liberalismo heavy metal na veia. PT ou PSDB fariam a mesma coisa, embora sejam agremiações de origens diversas.
É trágico que a farsa seja pilotada por dois partidos surgidos no desmanche institucional da ditadura militar (1964-85). Eram legendas que moldaram as nervuras centrais de nossa institucionalidade, a partir da Carta de 1988.
COMPLETAR O SERVIÇO – No entanto, o serviço não está completo. É preciso avançar e desmontar o pacto celebrado em 1988, ao fim de um formidável ascenso do movimento popular. O choque das demandas de baixo com privilégios seculares tem sua síntese na chamada Constituição Cidadã.
Em vários aspectos – em especial na parte social -, ela representa o que de mais avançado produzimos em quase dois séculos de vida independente.
Com a ofensiva da financeirização econômica a partir dos anos 1990, um período de nossa história foi vencido. Trata-se do nacional-desenvolvimentismo, que buscou moldar ao sul do Equador um país de renda média, com todas as etapas da industrialização internalizadas e com grande margem de soberania econômica.
Tais ideias estão plasmadas no texto original da Carta de 1988. A partir do início da década seguinte, elas tornaram-se “ideias fora do lugar”, para usar conceito definido por Roberto Schwarcz.
Ato contínuo, os governos Collor, FHC, Lula e Dilma investiram pesado em mais de 60 emendas que dilapidaram vários itens progressistas daquele documento-pacto.
NOVA ETAPA – Chegamos neste 2015 a uma nova etapa do projeto neoliberal. Trata-se de reduzir internamente os custos do trabalho. Para isso, trata-se de limar artigos que garantem direitos e conquistas que vêm dos anos 1940. Trata-se de terceirizar, precarizar, atacar a área pública e outros tópicos semelhantes.
Este é o miolo do projeto em curso. O neoliberalismo depois de privatizar e mudar a agenda do Estado, volta-se para o mundo do trabalho.
Esta questão era abraçada por Aécio Neves (que dava sinais de suas pretensões) e de Dilma Rousseff (que mentiu sobre seus reais propósitos).
O programa dos grandes partidos é um só. O ajuste está em andamento.
É preciso repetir que ele não atenta apenas contra a economia brasileira e nosso povo.
Ao desqualificar a escolha popular pelo voto, ele representa um atentado à democracia duramente construída.
É isso que Dilma, o PT, o PMDB, o PSDB, a grande mídia e o capital financeiro estão fazendo.
Contra seus desígnios é necessário investir. E é possível vencê-los, com unidade e energia.
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*Gilberto Maringoni é jornalista, cartunista e professor da Universidade Federal do ABC.
Charge: Gilberto Maringoni
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