Segundo a apuração da Human Rights Watch, as mulheres que conseguem registrar as denúncias têm que contar as histórias, incluindo as de abuso sexual, em ambientes abertos, recepção, e não em salas que garantam a privacidade. Outro dado destacado no relatório é o de que nenhum policial civil em Roraima recebe treinamento para lidar com casos de violência doméstica.
“Alguns policiais, ao receberem mulheres em busca de medidas protetivas, redigem suas declarações de forma tão descuidada que faltam informações básicas para os juízes decidirem se devem ou não conceder a medida protetiva”, diz o relatório. “O Estado está deixando de cumprir com a obrigação internacional que tem de proteger as mulheres e está perdendo a oportunidade de prevenir o agravamento da violência contra as mulheres. Esse é um ciclo que vai piorando e se o Estado não atua isso pode acabar na morte da mulher. Alguns dos problemas que vimos em Roraima são recorrentes no país, como as delegacias da Mulher estarem fechadas nos horários em que há mais violência”.
Outro dado diz que a Polícia Civil não tem capacidade para cuidar de todas as ocorrências que recebe. Em Boa Vista, por exemplo, nenhum dos 8.400 boletins de ocorrência de violência doméstica foi investigado, segundo informações da delegada titular da delegacia da Mulher. A polícia instaurou inquérito em outros 5.000 casos em Boa Vista, sendo que muitos têm se arrastado por anos sem nenhuma conclusão, disseram à Human Rights Watch funcionários do Juizado Especializado de Violência Doméstica.
Com base nesses dados, a organização não-governamental entregou o relatório às autoridades com recomendações para que a situação seja revertida. Entre elas a necessidade de as delegacias da Mulher funcionarem em todos os horários, treinamento dos policiais, a investigação de todos os casos de violência doméstica, fiscalização adequada das medidas protetivas, todas as delegacias com salas privativas para receber os depoimentos das vítimas reservadamente e a publicação dos dados sobre os casos.
“É preciso ainda mudar a forma de colher o depoimento. A prática comum é que quando uma vítima vai apresentar a denúncia, a polícia só pega um depoimento curto e depois vai entrar em contato por telefone para fazer o termo de declaração. Só que esse ‘depois’ às vezes nunca acontece e a denúncia não vai a lugar nenhum. A polícia tem que pegar a declaração completa e não deixar para depois”, reforçou.
Governo de Roraima
Em nota, o governo de Roraima informou que vem implementando políticas de prevenção e combate à violência contra a mulher, que tem resultado na diminuição dos assassinatos. De acordo com o governo estadual, o número de boletins de ocorrência aumentou, enquanto o número de homicídios de mulheres caiu.
Em 2014, a Secretaria de Segurança Pública registrou 516 boletins, em 2015, foram 1.575; em 2016, 3.913; e 805 até o mês de maio deste ano.
“Em 2015, foram registrados 28 homicídios contra mulheres. Já em 2016, foram 10 mortes, uma queda de 64%. Em 2017, até o mês de maio, não foi registrado nenhum homicídio contra mulheres no Estado. Esses números demonstram que as políticas públicas de conscientização das mulheres para vencer a barreira do silêncio e sair do ciclo da violência, aliado à humanização das forças policiais para promover o atendimento adequado às mulheres, têm dado resultados, uma vez que em apenas um ano (entre 2015 e 2016) o registro de ocorrências mais que dobrou”, informa a nota.
Sobre o atendimento da polícia para casos de violência contra mulheres, o governo estadual informa que “mulheres têm encontrado no atendimento da Polícia Civil de Roraima segurança e confiança e têm perdido o medo de denunciar os seus agressores, sabendo que terão medidas de proteção quando denunciam. Todas as delegacias do estado, não só na Delegacia Especializada de Apoio a Mulher – DEAM, recebem as queixas e orientam as mulheres a registrar o Boletim de Ocorrência ou realizar o pedido de medidas protetivas, que prontamente tem sido atendido pelo Juizado Especializado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.Entretanto, se houver alguém que se sinta prejudicado pela não realização do Boletim de Ocorrência, deve procurar a Corregedoria da Polícia Civil e registrar a reclamação, que será aberto procedimento para apurar as razões”.
Ainda de acordo com o governo, os efeitos das medidas adotadas nos últimos dois anos e meio não foram contabilizados no relatório da organização, que fez levantamento com dados até 2015.
Fonte: Agência Brasil / Flávia Albuquerque. Edição: Carolina Pimentel
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