A Venezuela, em julho de 2024, permanece como um dos cenários mais desafiadores e complexos da política latino-americana. As recentes eleições e a contínua resistência do chavismo diante de pressões internas e externas refletem a profunda polarização e os desafios enfrentados pelo país. Este texto busca detalhar os principais aspectos da situação política atual na Venezuela, com base na análise de Edson Carneiro Índio, da Executiva Nacional da Intersindical, que esteve no país como observador internacional durante as últimas eleições.
Desde a ascensão de Hugo Chávez ao poder em 1999, a Venezuela passou por transformações profundas. O “socialismo do século XXI”, implementado por Chávez, representou uma ruptura com as políticas neoliberais que predominavam na região. O chavismo trouxe consigo uma redistribuição massiva de riqueza, com programas sociais voltados para as classes populares, financiados principalmente pelas receitas do petróleo, que, durante anos, sustentaram a economia venezuelana.
No entanto, a queda drástica nos preços do petróleo a partir de 2014, combinada com sabotagens, tentativas de golpe, exclusão do país do sistema internacional de pagamentos, expropriação das reservas internacionais pelos EUA e aumento das sanções internacionais, mergulharam a Venezuela em uma crise profunda. A hiperinflação, a escassez de alimentos e medicamentos, e uma migração em massa para países vizinhos tornaram-se marcas desse período. Com a morte de Chávez em 2013, Nicolás Maduro, seu sucessor, herdou um país dividido e com desafios econômicos e sociais colossais.
A oposição, composta em grande parte por setores da extrema-direita, nunca aceitou o projeto chavista. Desde o início, tentou minar o governo de Chávez e, posteriormente, o de Maduro, usando de todas as formas possíveis de desestabilização, desde tentativas de golpes de Estado, locautes e até campanhas internacionais para isolar economicamente o país.
As eleições de 2024 foram um novo capítulo na história de resistência do chavismo. A extrema-direita venezuelana, que esperava uma disputa acirrada, mais uma vez viu suas esperanças frustradas quando Nicolás Maduro emergiu vitorioso. O processo eleitoral, observado por uma delegação internacional de mais de 900 pessoas de 120 países, foi alvo de sabotagens, incluindo ataques cibernéticos ao sistema eleitoral, que, segundo Edson Carneiro Índio, foram patrocinados por setores da extrema-direita internacional, ligados ao ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Índio, que já havia estado na Venezuela em outras ocasiões eleitorais, como em 2004 durante o plebiscito revogatório do mandato de Chávez, e em 2021 nas eleições para a Assembleia Nacional, destacou que a segurança do sistema eleitoral venezuelano é robusta. Apesar das sabotagens, a contagem de votos foi mantida, e o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) declarou Maduro como vencedor, com uma maioria eleitoral irreversível.
Um aspecto marcante das eleições foi a data escolhida para o pleito: o aniversário de Chávez. Essa escolha estratégica visava resgatar o voto chavista, reforçando o legado do líder bolivariano, que goza de expressivo apoio popular principalmente entre a população mais pobre.
Um dos pontos mais destacados por Edson Carneiro Índio em sua análise foi a surpreendente recuperação econômica da Venezuela nos últimos anos, apesar das severas sanções econômicas impostas pelo imperialismo. Desde 2014, a Venezuela foi alvo de mais de 930 sanções, que atingem praticamente todos os setores da economia, mas principalmente a indústria petrolífera, o “centro nervoso” da economia venezuelana.
Mesmo sob essas condições, a economia venezuelana tem mostrado sinais de recuperação. O país já acumula 12 trimestres consecutivos de crescimento, e a inflação, que foi um problema crônico por décadas, está agora no menor patamar em 40 anos. Isso foi possível, em parte, pela decisão do governo de Maduro de regularizar a dolarização da economia, que anteriormente era feita de forma paralela e ilegal. Essa medida ajudou a estabilizar a economia e a controlar a inflação.
Outro fator crucial para a recuperação foi o aumento da produção interna de alimentos. Até 2019, a Venezuela importava mais de 80% dos alimentos consumidos no país. Hoje, mais de 90% dos alimentos são produzidos internamente, o que não apenas ajudou a contornar as sanções, mas também a garantir o abastecimento alimentar da população.
No entanto, os desafios permanecem. Os salários continuam baixos, e o poder de compra da população é limitado. Mas, através de programas como os CLAPs (Comitês Locais de Abastecimento e Produção), o governo tem conseguido garantir o acesso aos alimentos, mesmo para as camadas mais vulneráveis da população.
A Venezuela possui as maiores reservas de petróleo do mundo, o que a torna um alvo constante de interesse internacional, especialmente em um contexto de crise energética global, exacerbada pela guerra na Ucrânia. Desde a nacionalização da PDVSA, a gigante estatal de petróleo, o imperialismo nunca perdoou o governo chavista por tirar a empresa das garras das grandes empresas privadas do setor e por utilizar as receitas do petróleo para financiar políticas públicas e redistribuir a riqueza.
Apesar de todos os esforços para desestabilizar o governo, incluindo o apoio a tentativas de golpe e a imposição de sanções econômicas, a Venezuela conseguiu manter o controle sobre sua principal fonte de renda. A resistência do governo Maduro em privatizar a PDVSA e outras riquezas naturais, como o ouro, tem sido um dos principais motivos para a continuidade das agressões imperialistas.
Um dos aspectos mais impressionantes do chavismo é sua profunda organização popular. O PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela), que é o maior partido do país, tem uma estrutura organizativa que se estende por todo o território nacional. Essa organização é composta por comitês eleitos em mais de 260 mil ruas e 48 mil bairros, com uma forte participação feminina – cerca de 80% das lideranças desses comitês são mulheres.
Além disso, o chavismo tem promovido a formação de comunas territoriais, que são estruturas de autogestão comunitária. Essas comunas foram fundamentais para a resistência do país durante os períodos mais críticos, como a pandemia de COVID-19, quando as sanções internacionais dificultaram o acesso a vacinas e insumos médicos. Durante esses tempos difíceis, foram as estruturas populares que garantiram que alimentos e remédios chegassem às casas das pessoas, evitando uma catástrofe humanitária.
As milícias populares, treinadas e coordenadas pelas Forças Armadas, também desempenham um papel crucial na defesa do país. Com mais de 3 milhões de pessoas treinadas militarmente, essas milícias são um sinal claro de que qualquer tentativa de invasão do país enfrentaria não apenas as Forças Armadas, mas também a resistência armada da população.
A Venezuela, como outros países que resistem ao imperialismo, tem sido alvo de uma guerra híbrida, que combina elementos de guerra econômica, psicológica, e, em alguns casos, militar. A extrema-direita venezuelana, com o apoio de potências estrangeiras, tem utilizado todos os meios possíveis para desestabilizar o governo, desde ataques cibernéticos até a contratação de mercenários para assassinar líderes chavistas.
Mesmo diante desses desafios, o chavismo se mantém como a força política dominante na Venezuela. A extrema-direita, liderada por figuras como María Corina Machado, continua a não reconhecer os resultados eleitorais e a promover todo tipo de sabotagens contra o país. No entanto, falta a eles o apoio popular necessário para derrubar o governo.
Segundo Edson Carneiro Índio, a situação em Caracas, durante as eleições, era de normalidade. As ruas estavam cheias de gente, e a segurança, que já foi um problema grave no passado, melhorou significativamente. Apesar das tentativas de desestabilização, a vida cotidiana na capital venezuelana não refletia a imagem de caos e violência propagada pela mídia internacional.
A situação política na Venezuela em 2024 é um exemplo claro da resiliência do processo bolivariano. Apesar das sanções, das tentativas de golpe, e das campanhas de desinformação, o chavismo se mantém firme, sustentado por uma organização popular robusta e uma aliança cívico-militar que garante a defesa da soberania nacional.
A análise de Edson Carneiro Índio nos oferece uma visão detalhada e objetiva da realidade venezuelana, contrastando com a narrativa distorcida frequentemente apresentada pela mídia internacional. A Venezuela, apesar de todos os desafios, continua a resistir às pressões imperialistas, mantendo viva a chama da revolução bolivariana.
O futuro do chavismo dependerá da capacidade do governo de continuar a resistir às pressões externas, ao mesmo tempo em que promove a recuperação econômica e melhora as condições de vida da população. A luta pela soberania nacional e pela justiça social, que tem sido a marca do chavismo desde a eleição de Chávez, continua a ser o principal motor do processo político na Venezuela.
Redação: Secretaria Nacional de Formação da Intersindical
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