A crise econômica argentina se aprofundou nas últimas semanas e deixou o governo neoliberal de Mauricio Macri na mais complicada situação desde que assumiu a presidência, em dezembro de 2015.
A pressão vem tanto do mercado financeiro (através de fuga de capitais, que desvaloriza o peso frente ao dólar) quanto do povo e da classe trabalhadora que apresentam altos níveis de organização e mobilização social. A greve geral desta terça-feira (25), a quarta e maior paralisação durante o governo Macri, é prova disso.
O recado das ruas é claro e uníssono: chega de ajuste e fora FMI!
A alta do dólar, que chegou a valer 40 pesos argentinos (valorização de 100% desde o início do ano), foi o estopim para Macri apostar em um plano de ajuste radical, após acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo corta drasticamente o gasto público e aumenta tarifas de serviços básicos.
A austeridade é tão grande que fez com que os Ministérios da Saúde e do Trabalho, por exemplo, fossem rebaixados ao status de Secretaria.
No caso da Educação, o sucateamento contínuo levou à greve em 57 universidades por mais de um mês. Além da óbvia degradação do serviço público, o saldo é de demissões em massa de funcionários públicos.
Com a bandeira “Unidade dos trabalhadores contra o ajuste”, a greve geral desta terça-feira é desdobramento de outras três greves gerais, que nos últimos dois anos já denunciavam o que viria com o governo Macri.
Esta quarta greve, a maior, deixou o transporte público da capital Buenos Aires (metrô, trem e ônibus) totalmente parado, assim como os aeroportos, as viagens dos caminhoneiros e os estabelecimentos bancários. Repartição públicas, escolas, universidades também ficaram de portas fechadas.
A única movimentação nas avenidas é dos manifestantes. A tradicional da praça de Maio e seus arredores foi novamente tomada pelos trabalhadores em greve e pela população que se levanta com a política econômica do governo. Além de Buenos Aires, a greve também causou grande impacto em outras grandes cidades do país, como La Plata, Rosario e Jujuy.
Enquanto isso, Macri está em Nova Iorque, na assembleia da ONU, onde tentará, em vão, melhorar a imagem de seu governo.
Quando assumiu o governo, derrotando o candidato do kirchnerismo, o empresário Mauricio Macri logo mostrou ao que vinha. Uma das primeiras medidas aplicadas foi reduzir (em alguns, eliminar) impostos de exportação da produção agropecuária e da mineração. Assim, uma das principais fontes de arrecadação foi perdida.
Por outro lado, Macri liberalizou as remessas de capitais das empresas estrangeiras instaladas na Argentina para suas sedes nos países ricos (antes, as multinacionais estavam obrigadas a reter as dividas por pelo menos um ano no país).
Em seguida veio o “tarifaço”, com aumento nas taxas de serviços públicos como luz, água, gás, transporte e combustíveis, que reduziu o poder de compra das famílias e asfixiou o mercado interno e a produção econômica.
Tudo isso veio acompanhado de uma desregulação total do mercado financeiro, aliado a altas taxas de juros, que levaram a uma enxurrada de capital especulativo no país.
Esse “capital vadio” não se converte em investimento nas indústrias e na geração de empregos. Pelo contrário, deixa a economia nacional refém do mercado financeiro. Isso porque, com a elevação da taxa de juros nos Estados Unidos, grande parte desse dinheiro voltou para casa, gerando fortes crises cambiais no país, primeiro em maio e agora em agosto.
Para lidar com a fuga de capitais, Macri elevou a remuneração de juros para 60%, cifras espetaculares a nível mundial. O resultado é que o acesso a crédito para pequenas e médias empresas tornou-se simplesmente impossível, provocando quebras generalizadas e eliminação de postos de trabalho.
Com a crise da falta de dólares em uma economia dependente de exportações, Macri acabou trazendo de volta à Argentina o fantasma do Fundo Monetário Internacional (FMI).
O acordo assinado em junho, no valor de US$ 50 bilhões, fez do país o maior devedor do FMI. Em contrapartida, o fundo, controlado pelo sistema financeiro internacional, exigiu ainda mais ajustes neoliberais, o que ficou conhecido “ajustes dos ajustes”. O objetivo ilusório é a redução do déficit fiscal para zero até 2019.
O resultado é sentido atualmente, com uma crise social que só aumenta. Além do corte em direitos sociais e políticas públicas, a Argentina convive com uma taxa de desemprego estimada entre 10% e 12%, aumenta da informalidade e desvalorização do salário, com uma inflação que deve passar de 35% no ano.
O início do governo Mauricio Macri, em 2016, foi fartamente celebrado por políticos e pela imprensa neoliberal (supostamente especializada em economia). João Dória qualificou a gestão de Macri como “moderna e eficiente”. Já Miriam Leitão, da Rede Globo, há um ano, dizia o seguinte:
“A economia da Argentina está em recuperação e pode crescer 3% este ano e 4% no ano que vem. Isso explica em parte a vitória do presidente Mauricio Macri nas eleições do último final de semana. O ajuste promovido pelo governo já traz resultados concretos que começam a ser percebidos pela população. A recuperação do Brasil também tem ajudado, pelas fortes relações comerciais entre os dois países”.
Que o exemplo neoliberal argentino (de desregulação do sistema financeiro e cortes no gasto público) seja bem compreendido pelos brasileiros, apesar da manipulação midiática.
Texto: Matheus Lobo
Foto: AFP Photo
CLIQUE E ACOMPANHE A INTERSINDICAL NAS REDES
Comentários