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“Bolsonaro já deixou de ser ameaça só para os indígenas e uma ameaça mundial “ afirma Sônia Guajajara.

Imagem: Comunicação da Intersindical
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Edson Carneiro Índio entrevista a candidata à vice-presidenta da República nas últimas eleições, Sônia Guajajara, que fala sobre os impactos do COVID e do Governo nas comunidades indígenas

Índio: Gostaria que nos contasse sobre as mortes que estão ocorrendo diante da ausência de políticas públicas de proteção de saúde dos povos indígenas. Qual real situação dos povos indígenas diante do COVID-19?

Sônia Guajajara: Aqui temos desafio dobrado, além do coronavírus temos de enfrentar presidente, um sujeito que tem gerado muita confusão, muita dúvida. Temos trabalhado grande, para além de descontruir tudo que o Bolsonaro vem falando, nós indígenas estamos buscando nos cuidar mais por contra própria. O descaso do governo não é de agora, desde a campanha ele demonstra que não gosta de índios, pobres e pretos; ele gosta de lucros e grandes empresas, do agronegócio. Então, os oprimidos estão todos no mesmo buraco, na mira do governo.

Quando começamos a orientar as pessoas a ficarem em casa, todos já sentiram a preocupação do que representa uma pandemia; temos um histórico violento do que representou as pandemias para os povos indígenas. Temos outro tipo de imunidade, da própria alimentação, mas diante de deste tipo de pandemia não é fácil resistir. Sempre fomos assolados por este tipo de problema, muitos povos indígenas foram dizimados pela malária, coqueluche, varíola, sarampo, febre amarela, então quando acontece uma pandemia é como uma avalanche. Muitos ainda não têm como se proteger porque não tem seu território demarcado, alguns estão em situação de acampamento aí é duplicada a vulnerabilidade, porque os povos que estão acampados não são apoiados por políticas públicas.

Agora não temos como combater as invasões de nossas terras como antes, mas os ataques, violência continuam, estamos resistindo a isso como podemos, mas agora temos de combater o vírus também e procurar não inviabilizar todas as demais pautas por causa disso. Estamos orientandos os bloqueios, para evitar contágio, agora a FUNAI lançou a campanha para não bloquear as estradas, e que agora a solução para barra a contaminação é lavar a mão depois de tocar em tudo. Estamos fazendo esforços neste sentido, mas só por estas medidas é difícil evitar a contaminação, porque o modo de vida indígena é comunitário e compartilhado, o que facilita muito mais a propagação. Por isso, o correto e evitar que o vírus chegue nas aldeias, por isso os bloqueios, é para evitar novo genocídio.

A Secretaria Especial de Saúde Indígena – SESAI tem realizado o levantamento da contaminação entre os povos indígenas, mas não está contabilizando os que estão fora no contexto urbano. Ainda assim, desconsidera totalmente a situação geográfica, os contextos, daí subnotifica os casos, o indígena contaminado acaba não sendo registrado como tal.

Estamos contabilizando cerca de 6 óbitos entre indígenas, primeira morte foi no povo Barari (PA), tivemos um caso em Manaus (AM) do povo Mura; um jovem ianomâmi em Roraima teve contaminação que atribuímos aos garimpeiros invasores, temos ainda vítimas dos povos Ticuna, Cocama e Satare Maue, todos do Amazonas. Então se soma 6 mortes todas na região amazônica. Manaus está em colapso, é crescente o número entre indígenas, o percentual cresceu de 156% nas últimas semanas. Isso nos alerta, a SESAI precisa contabilizar os casos de índios de forma igualitária, são 114 grupos de povos isolados que estão ameaçados por madeireiros e caçadores, todos vetores de contaminação, a SESAI não está identificando casos comunitários ainda, está tentando buscar referências e com isso estima número muito maior, muitas são as medidas a serem tomadas para evitar as mortes pelo vírus e outros ataques que matam igualmente.

Índio: Eu estava acompanhando a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB que vez representação à Comissão Interamericana de Direitos Humanos em relação às mortes de membros do povo Guajajara. Como esta essa situação do povo Guajajara e encaminhamento dessa denúncia?

Sônia Guajajara: Essa situação já é histórica atribuída justamente à impunidade. De todos os assassinatos, absolutamente ninguém está pagando pelos crimes, nos últimos 5 meses foram 5 assassinatos, só do povo Guajajara, é um número absurdo e todos seguem impunes. A impunidade é a principal ferramenta que promove a violência. Isso acontece também por conta racismo, da intolerância, do discurso de ódio, que colocar a gente no lugar do obstáculo. Isso tem estimulado as pessoas, que já tem essa vontade, de praticarem crimes contra nós. Eles ficam à vontade pois o próprio presidente fala que não haverá terra demarcada, que índio não é gente, que o Brasil precisa crescer e terras indígenas impedem. Fica sempre colocando a sociedade contra a gente, os criminosos se sentem legitimado, então a APIB entrou com essa denúncia em relação ao descaso das autoridades para elucidar estes crimes. É preciso que haja justiça para não haver vingança, porque os próprios indígenas com a sede de justiça já querem partir para uma vingança, como fala do próprio Zezico, não podemos permitir isso, é preciso acalmar as pessoas para evitar violência, lutar por justiça e não por vingança. Ainda no final do ano passado, o Secretário de Segurança Pública do Maranhão que esteve na minha aldeia para uma reunião – já haviam acontecidos alguns assassinatos – o próprio Flávio Dino publicou decreto que garante nossa segurança, naquele momento Zezico trouxe denúncia de punir todos os que cometem crime independente se são indígenas ou não para não reproduzir práticas perversas.

Índio: Sônia, você já falava da ofensiva do agronegócio que vem buscando expulsar povos indígenas, agora o governo não querer demarcar, quer expulsar e dizimar completamente os povos que resistiram ao longo de tantos processos. Ainda tem a questão do garimpo, como umas das formas mais brutais de extermínio dos povos. Queria que você comentasse com a gente aqui sobre isso.

Sônia Guajajara: A semana passada anunciaram uma portaria do Ministério de Minas e Energia, Portaria 135, que considera atividades mineradoras como essenciais. Imagina que estamos dizendo que os mineradores são os principais vetores do COVID-19 para os povos indígenas, e eles consideram que mineração é atividade essencial.

Um projeto de lei que libera a mineração em territórios indígenas foi apresentado por Bolsonaro, e fizemos pressão para que esse projeto não fosse votado, tivemos a palavra do Rodrigo Maia que se comprometeu a segurar esse PL, só que agora existe pressão da Vale e outras mineradores que se libere os territórios para mineração. Isso significa entregar nossos territórios, ainda mais em um período tão grave em que estamos passando. Vamos ter que lutar, nos opor a algo que é errado, mas que eles pretendem que seja legalizado.

Temos de fazer o enfrentamento e derrubar esse governo que está destruindo com tudo, aumentou em 29 ou 30% o desmatamento em um mês imagina. Aí o IBAMA organizou operação para combater garimpo ilegal, o Ministro do Meio ambiente já demitiu o diretor do IBAMA, quem organizou essa operação. Agora estamos convivendo com essa situação que além de destruição está violentando o modo de vida indígena. Por isso lançamos o Abril Vermelho para trazer essas pautas que estão abertas, para que as pessoas possam saber que o foco do corona não podem deixar essas pautas em abertos. Temos uma programação anunciada, mas nossa agenda está aberta para contribuições e atividades, para isso basta se escrever nos nossos links disponíveis nas nossas páginas do Mídia Ninja. Estamos organizando e vamos divulgar para que as pessoas possam acompanhar ao vivo direto das aldeias. Poderão conhecer de perto a nossa vida, cultura. Temos também a vaquinha on line, a vaquinha da APIB, para garantir segurança alimentar das pessoas, teremos também o Terra Livre, acampamento virtual.

Precisamos então de uma reação imediata, Bolsonaro já deixou de ser ameaça só para os indígenas e uma ameaça mundial, um líder da negação de tudo que é garantido pelos Direitos Humanos.

ASSISTA A ENTREVISTA COMPLETA AQUI:

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