A reunião da Direção Nacional da Intersindical Central da Classe Trabalhadora, realizada no sábado (22), em São Paulo, foi aberta com uma análise sobre os desafios e rumos da esquerda para os próximos dias. Segundo as projeções do economista Guilherme Santos Mello, professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos de Conjuntura, a política econômica do governo Temer – sustentada apenas nos investimentos privados – não resultará em crescimento econômico nem em validação política para os golpistas. E Bernadete Menezes, secretária de Defesa do Serviço Público da Intersindical, fez uma análise sobre os acertos de posicionamento da Intersindical no atual cenário político.
Confira os principais temas e posicionamentos dos palestrantes:
Guilherme Mello – A defesa da ampliação e melhoria dos serviços públicos pode ser o coração da estratégia de resistência aos ataques contra os direitos sociais. Estão encomendando a invalidação da Constituição de 1988 que garante saúde, educação pública… A PEC 241 é o desmonte do estado brasileiro. Hoje o Estado gasta algo em torno de 19% do PIB com despesas primárias. Isso vai cair para 13% do PIB. Hoje gastamos 8,5% na Previdência com a reforma vai subir para 10% nos próximos anos por causa do envelhecimento da população. O espírito deste governo é a destruição total do Estado brasileiro e a incapacidade de produzir bens materiais e públicos, por isso estão acabando com a Petrobras, o BNDES… tirando isso sobra o quê?
Bernadete Menezes – Estamos num momento difícil de conjuntura. Não quer dizer impossível. A maior parte do movimento social está na defensiva. Esse país acumulou organizações, experiência, tradição e história na esquerda. Nós nos apoiávamos tanto nessa construção que achávamos que nunca mais teríamos golpe. Mas a juventude não tem nossas decepções, os jovens estão indignados com o que está acontecendo e têm garra. A Intersindical tem enorme potencial para crescer, respeitamos as diferenças e entendemos que garantir a unidade é uma tarefa histórica.
Guilherme Mello – É importante fazer um balanço dentro do movimento sindical e das esquerdas que contemple a necessidade de se valer de estratégias de diálogo que disseminem seus ideais pelo conjunto da sociedade. Esta tarefa precisa ser enfrentada com mente aberta, sem purismos, pois é impossível para a esquerda avançar em uma sociedade dominada por valores preconceituosos e economicamente liberais dentro de uma nova organização social e do novo mundo do trabalho.
Bernadete Menezes – A Intersindical acertou no seu posicionamento em relação ao golpe, deixamos clara a nossa resistência ao governo Dilma e a visão de que o que houve foi um golpe para implementar uma agenda de retrocessos contra a classe trabalhadora, que vem se confirmando dia após dia, com esses ataques profundos contra a previdência, a CLT, a destruição da Justiça do Trabalho… Também acertamos na formação de uma frente ampla dentro da esquerda com a Frente Povo Sem Medo. O centro da discussão neste momento é a unidade. Se ficarmos discutindo as maneiras de construir a unidade isso vai se inviabilizar. Temos que nos unir porque a hora agora é de guerra contra a agenda de retrocessos deste governo. Temos que nos juntar para resistir, apesar das diferenças.
Guilherme Mello – Estamos completando quase dois anos de neoliberalismo no país, desde que Joaquim Levy assumiu o Ministério da Fazenda. Até então havia uma outra linha no governo. Os resultados não eram maravilhosos e nem desastrosos, tanto é que a Dilma ganhou a eleição. Só que em janeiro de 2015, quando se anunciou o Joaquim Levy, ficou clara uma guinada violenta de orientação e a defesa do ajuste fiscal.
O governo assumiu o discurso dos derrotados na eleição, defendendo ajuste com sofrimento, dizendo que ia resolver e que daqui a pouco íamos retomar o nosso crescimento. O Gonzaga Beluzzo já disse publicamente que foi conversar com o Lula e avisou que aquele ajuste ia dar muito errado. E o Lula respondeu: estou tranquilo porque o Palocci disse que em três meses a gente vai crescer de novo. Isso não aconteceu.
O que a Dilma fez foi a agenda da Fiesp, apresentada pelos empresários, que pedia várias medidas para a retomada do investimento privado. Pediam a redução da taxa de juros, a desoneração de impostos e da folha de salários, reclamavam do custo alto da energia elétrica e que a taxa de câmbio não ajudava. O ano de 2011 foi uma preparação para a agenda da Fiesp porque havia debate no governo de que era preciso fazer um ajuste para possibilitar o Banco Central reduzir a taxa de juros. Vieram desonerações, a redução da taxa de juros e o governo abriu mão de receitas. E a gente sabe qual foi o resultado. Em dois anos a Fiesp já estava pedindo o impeachment. Minha interpretação resumida do que deu errado: o empresário brasileiro não é mais aquele. Não tem projeto de desenvolvimento nacional. O empresário brasileiro virou importador e rentista. Boa parte do capital produtivo vai para o título público. Com a queda da taxa de juros e aumento do câmbio ele perdeu.
Guilherme Mello – Estamos diante de um neocolonialismo. Muitos questionam: o Brasil vai crescer mesmo que abra, entregue e venda tudo aos estrangeiros? Petrobras, aeroportos, portos, empresas públicas de energia…? Porque o medo de muitos segue o raciocínio: se o país crescer esse governo se sustenta por um tempo, ganha validação política. No curto prazo, pode ser que sim. Mas a equação do PIB demonstra que não.
Equação do PIB = Consumo privado + Investimentos totais (públicos e privados) + Gastos do governo + (Exportações – Importações)
Com a queda do consumo, dos investimentos públicos e o aumento das importações só o aumento do investimento privado não segura o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil.
O governo descobriu que não só de fé vive o homem. Não basta ter fé que vai crescer. Os representantes do governo dizem tranquilos: “tudo bem, os investimentos estrangeiros vão segurar”. Mas não vão.
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