Dando continuidade ao debate em torno da proposta de “reforma” trabalhista do governo, consubstanciado no PL 6.787/16, é preciso que se diga: o projeto é desnecessário! É inoportuno! Porque propõe como soluções para a crise do desemprego fórmulas testadas e desaprovadas aqui e lá fora. E sob conjuntura econômica que degrada o trabalhador e principalmente a trabalhadora!
O projeto é uma demanda do mercado, que embora saiba que para gerar emprego é preciso investimentos para fazer a economia voltar a crescer para o Brasil voltar a se desenvolver; mas, propõe restrições e retrocessos, porque, ao fim e ao cabo, quer maximizar seus lucros, sem amarras que lhe imponha regramentos e restrições para tal intento.
A proposta do governo, por demanda do mercado, é rejeitada pelo Ministério Público do Trabalho, que recomenda-lhe rejeição parcial e ajustes. Então vamos ao contencioso.
Fundado na ideia que a CLT é “velha”, não oferece “segurança jurídica” e não ajuda a “melhorar o ambiente de negócios”, os empresários, há décadas propõem a extinção da legislação trabalhista. Mas não diz que a “velha” septuagenária CLT está recauchutadinha, já foi atualizada em 85% do seu texto. Está rejuvenescida! Está atualizada!
A CLT, de fato, não dá “segurança jurídica” para fazer o querem: demitir sem custo, contratar precariamente, esgaçar a mão de obra com jornadas escorchantes, sem segurança, e outros acessórios importantes para o bem-estar do trabalhador ou trabalhadora. A segurança jurídica que quer o mercado é a insegurança jurídica dos trabalhadores. A “melhoria do ambiente de negócios” é o eufemismo utilizado para dizer que querem a desregulamentação total das relações de trabalho.
Mas vamos a outros aspectos do projeto. O trabalho em regime parcial, que hoje é de 25 horas, a proposta é aumentar para 30 horas, e mais 26 de horas extras.
Ora, se o empregador, pelo projeto, poderá empregar um parcial em regime quase integral, e pagando salário de parcial, por que contratar um trabalhador em regime integral?
O contrato de trabalho temporário dura hoje 90 dias, prorrogáveis por mais 90, e o projeto amplia para 120, prorrogáveis por mais 120. Seriam oito meses de temporariedade. A mudança, segundo o governo, se faz necessária “motivada pela alteração sazonal na demanda por produtos e serviços”. Aqui o MPT vê dois problemas. A “ocorrência da alteração sazonal faz parte do risco do negócio e admiti-la como justificativa para a contratação de trabalhador temporário é transferir o ônus do empreendimento para o trabalhador, tendo em vista que se trata de contrato de trabalho que prevê patamar de proteção inferior ao contrato por prazo indeterminado. Além disso, haverá dificuldade em se conceituar sazonalidade para a caracterização do contrato temporário, o que irá gerar insegurança jurídica”.
No que diz respeito à ampliação do prazo de 90 para 120 dias, “não se apresenta qualquer justificativa para embasar a alteração”, diz o MPT. “Contudo, em razão de ser uma espécie contratual que estabelece um rol menor de direitos aos trabalhadores, conclui-se que a extensão das possibilidades de utilização causará prejuízo aos trabalhadores”.
E completa: “os contratos temporários, juntamente com os contratos por tempo parcial, tiveram na Europa e nos Estados Unidos enorme avanço após a crise econômica de 2008 e hoje organismos internacionais e os próprios governos nacionais reconhecem que o fenômeno se revelou socialmente nocivo, tendo produzido um aumento vertiginoso da desigualdade econômica e social”.
Mas há outros aspectos negativos no projeto. Não apenas no texto em si, mas também em relação ao momento em que foi apresentado. Numa conjuntura de depressão econômica e desemprego galopante, que obriga os trabalhadores a fazerem uma disputa injusta e desigual com o capital, semelhante àquela que se faz da “adaga contra o pescoço” ou aquela clássica, em que a “raposa é colocada para tomar conta do galinheiro”.
Dizer, por exemplo, como os empresários dizem, matreiramente, que a livre negociação entre patrões e empregados seria mais vantajosa que a legislação trabalhista é de uma desonestidade cretina!
Num momento como o que estamos vivendo, o trabalhador só tem desvantagens, porque as negociações são feitas sob ameaças que comprometem sua existência digna. Assim, para garantir o emprego, o trabalhador ou trabalhadora vai ter de abrir mão de direitos acessórios, porque se não abrir, perde o principal, o emprego!
Por isso, o “império da lei” é fundamental para o trabalhador, pois só a lei pode salvar o trabalhador da sanha pelo lucro incessante e a todo custo. Como diz o deputado Robinson Almeida (PT-BA), membro da comissão especial que discute o PL 6.787/16, “Nos conflitos entre capital e trabalho, o Estado, por meio das leis, deve garantir empregos decentes, como proclama a Organização Internacional do Trabalho (OIT).”
E acrescenta: “Por isso, a Constituição prevê acordo coletivo só para os casos de ampliação de direitos ou quando haja condições para soluções justas e equilibradas”, como determina o artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição de 1988.
Assim, por tudo isto e mais alguma coisa, não há como não dizer que a reforma trabalhista é tão ruim quanto a previdenciária.
*Marcos Verlaine é jornalista, analista político e assessor parlamentar do Diap.
Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
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