O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou em 30 de agosto que a taxa de desemprego no Brasil está em 11,8%. A Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) revelou que são 12,57 milhões de pessoas desocupadas.
A pesquisa é divulgada em trimestres móveis – ou seja, a cada mês divulga-se o resultado que considera o mês mais recente e os dois anteriores. Em relação ao trimestre móvel anterior, o desemprego apresentou queda de 0,2 ponto percentual.
A redução do desemprego ocorre principalmente por meio do aumento de vagas informais. Já são seis trimestres móveis consecutivos de aumento da informalidade, o que significa que esse tipo de trabalho está crescendo desde o trimestre que acabou em fevereiro de 2019.
Já em termos de remuneração, os rendimentos médios do trabalho estão diminuindo. E para 2020, o governo já anunciou que o salário mínimo não deverá ter aumento real. A proposta contida no orçamento de 2020 é que o reajuste pela inflação do período leve o salário mínimo dos atuais R$ 998 para R$ 1.039 no próximo ano. O orçamento enviado pelo governo ao Congresso também inclui cortes nas despesas e no orçamento público.
O rendimento médio mensal do trabalho caiu pelo terceiro trimestre móvel consecutivo no Brasil, quando comparado com o mesmo trimestre do ano anterior. A última vez que isso havia acontecido foi no segundo semestre de 2016, quando o Brasil estava em recessão.
A queda do rendimento médio ocorre apesar da queda do desemprego. Isso indica que o emprego que foi gerado é um de remuneração menor, o que costuma acontecer quando cresce o trabalho informal ou aquele com menos horas semanais.
O trabalho informal tem ganhado espaço no Brasil em 2019. Cinco categorias diferentes de trabalho se enquadram dentro do conceito de trabalho informal, conforme classificado pelo IBGE. São elas:
A informalidade no trabalho atingiu 41,3% dos trabalhadores ocupados no trimestre entre maio e julho de 2019. O valor representa a maior proporção de trabalho informal registrada na série da Pnad Contínua.
A alta da informalidade deve-se principalmente ao aumento no número de pessoas que trabalham por conta própria sem registro de CNPJ. A categoria costuma ter salários mais baixos quando comparados com o trabalho formal.
O tipo de trabalho que mais emprega no Brasil continua sendo o trabalho com carteira assinada no setor privado.
Quase 70% da população ocupada trabalha nas categorias privado com carteira assinada, por conta própria sem CNPJ ou privado sem carteira assinada. A evolução do trabalho nessas três categorias explica, em boa parte, os movimentos do emprego e da renda no Brasil nos últimos anos.
O número de trabalhadores formais do setor privado teve queda pelo segundo trimestre móvel seguido, quando feita a comparação com o período imediatamente anterior. No trimestre entre maio e julho de 2019, foram 33,15 milhões de pessoas trabalhando dessa forma, o que corresponde a 35,4% da população ocupada. É a menor proporção registrada desde o período entre setembro e novembro de 2018, quando foi registrada a baixa histórica da série (também em 35,4%).
Em termos reais, os rendimentos mensais para trabalhadores formais do setor privado (excluindo trabalhadores domésticos) ficaram em R$ 2.169,00. O valor é 0,96% menor do que aquele registrado um ano antes, no trimestre entre maio e julho de 2018.
Já são quatro trimestres seguidos de queda do rendimento real do trabalho formal privado, quando feita a comparação com o mesmo período do ano anterior.
Já a comparação do rendimento real mensal do trimestre móvel finalizado em julho com o trimestre imediatamente anterior mostra um aumento de apenas R$ 1,00.
Se o número de trabalhadores formais do setor privado vem caindo nos últimos anos, a quantidade de pessoas que trabalham informalmente por conta própria está em alta.
Já são 19,42 milhões que trabalham informalmente por conta própria, o que representa um aumento de 4,7% em relação ao mesmo trimestre do ano anterior. Este é o maior aumento na série de comparação com o mesmo período do ano anterior desde o trimestre encerrado em outubro de 2017.
A categoria inclui desde o dono do carrinho de pipoca até o motorista do aplicativo de transporte. São trabalhos que costumam ter rendimentos menores que os empregos formais.
Se no trimestre encerrado em julho de 2019 o rendimento mensal no setor privado formal foi de R$ 2.169,00, a renda dos trabalhadores informais por conta própria foi de R$ 1.312,00. A diferença é de quase R$ 850,00 no mês.
Em relação ao trimestre anterior, o rendimento médio mensal aumentou em R$ 4,00, o que representa uma alta de 0,31%. O registro do trimestre encerrado em julho interrompeu uma sequência de quatro trimestres consecutivos de baixa do rendimento médio por conta própria, quando comparado com o período imediatamente anterior.
Na comparação com o trimestre encerrado em julho de 2018, o rendimento médio desta categoria teve variação negativa de 0,6%.
O número de trabalhadores informais do setor privado chegou a 11,66 milhões no trimestre encerrado em julho de 2019. É a maior quantidade registrada pelo IBGE na série histórica.
Na comparação com o mesmo trimestre em 2018, a variação observada foi de 5,6%. Em relação ao trimestre encerrado em junho de 2019, a alta foi de 1,4%, com adição de 158 mil pessoas ao grupo.
Ao contrário do trabalho informal por conta própria, o trabalho sem carteira assinada no setor privado observou um aumento do rendimento médio nos últimos trimestres móveis.
No registro feito entre maio e julho de 2019, o rendimento mensal médio do trabalhador informal do setor privado ficou em R$ 1.427,00. A comparação com trimestre encerrado em junho (R$ 1.401,00) mostra uma variação positiva de 1,86%. Quando o parâmetro é o trimestre móvel terminado em julho de 2018, o aumento foi de 5,1%.
JULIANA INHASZ Por enquanto, parece não haver perspectivas para aumento da renda com tamanha informalidade na economia brasileira. O emprego formal, que vem acompanhado de elevações de renda, deve melhorar apenas quando a economia voltar a crescer com vigor e a perspectiva for de crescimento sólido. Quando isso acontecer, produtores perceberão que existe possibilidade de crescimento sustentável, com ganhos de médio e longo prazo, e aceitarão os custos mais elevados da contratação formal, que possibilitam crescimento da renda.
Nesse aspecto, haverá menor contingente de trabalhadores desempregados, o que forçará salários para cima, aumentando massa salarial. Até lá, no entanto, provavelmente continuaremos a ver a economia absorver trabalhadores no lado informal, com salários mais baixos e renda com grande dificuldade de crescimento.
RENAN PIERI Quando temos uma recuperação econômica como esta, após uma crise muito grande, os primeiros empregos a serem gerados são os empregos informais. Naturalmente – pelo menos no Brasil –, esses empregos informais pagam menos, em média. Temos observado uma diminuição da taxa de desemprego, mas com pessoas que entram no mercado ganhando menos.
A questão não é tanto se há melhora da renda somente com emprego formal. A questão está mais relacionada ao montante de desempregados que temos. Para você ter um aumento expressivo na renda, você precisa abaixar significativamente a taxa de desemprego. E esse processo de redução de desemprego passa por um momento em que são gerados muitos trabalhos informais. Depois, com desemprego menor e menos gente ofertando trabalho, aí sim as empresas vão se sentir mais seguras para formalizar, até porque já teríamos um processo econômico mais acelerado, com mais empregos formais aparecendo.
JULIANA INHASZ O salário mínimo representa um rendimento considerado base de maneira formal para poucas categorias de trabalhadores (muito embora seja muitas vezes considerado de maneira indireta para os ajustes que acontecem em convenções coletivas). No geral, as categorias negociam seus pisos salariais de forma independente, sendo o salário mínimo entendido, em termos práticos, como uma referência para o pagamento de benefícios, como aposentadorias, pensões etc.
Nesse aspecto, como esse salário de referência influencia muito pouco na determinação de salários da grande parte dos trabalhadores, seu reajuste nulo em termos reais tem pouca relação com o não aumento da renda real da população. É importante salientar que, atualmente, os rendimentos vinculados ao mínimo são parcela pequena da renda total, e que rendimentos reais mais elevados devem estar atrelados, em geral, à percepção de um aumento de produtividade, desdobrado como um aumento de produção em si.
Atualmente, essa produtividade em alta não parece ser a realidade da economia brasileira, sendo plausível considerar que este tipo de salário de referência não evidencie aumentos em termos reais. Em termos mais práticos, um mínimo sem aumentos reais significa que os favorecidos por benefícios em geral, ou então aquelas categorias que utilizam o salário mínimo como base, não reconhecerão ganhos em termos de poder de compra.
RENAN PIERI O salário mínimo não aumenta o salário médio da economia. Há alguns setores que pagam salário mínimo e em que os empresários têm bem mais poder de barganha que os funcionários. Em um cenário como tivemos no começo dos anos 2000, em que a economia cresce muito, aí sim o salário mínimo pode ajudar – tivemos aumento de salário mínimo e aumento de emprego ao mesmo tempo.
Em um cenário como o atual, é um pouco diferente. Sabemos que ao estabelecer um salário mínimo mais alto, você gera alguma distorção, encarecendo o custo da contratação. Em uma situação em que as empresas já não querem contratar, você pode ter dois possíveis efeitos: um aumento do desemprego ou da informalidade. Empiricamente, no nosso caso, costumamos aumentar a informalidade e afetar pouco o desemprego. Então, eu diria que o fato de não ter aumento do salário mínimo agora, de certa forma, faz sentido.
JULIANA INHASZ A trajetória da renda no Brasil pode impactar o crescimento através de diversos ângulos. O primeiro versa sobre o crescimento econômico: uma economia na qual a renda não aumenta é uma economia que não consegue crescer de forma sustentável e dinâmica. Como o crescimento está diretamente ligado à alocação de fatores que possibilitem a produção, se a remuneração desses fatores (a renda) não aumenta, não há crescimento econômico plausível de fato. Dessa forma, se não há crescimento econômico sólido, também não há aumento das possibilidades de consumo dessa população.
Quanto ao investimento, a ausência de aumentos de renda também torna inviável o aumento do investimento do país, que se desdobra em uma baixa capacidade produtiva. Se a capacidade produtiva é baixa, a produtividade também deverá ser menor do que a aquela desejada, de modo que a economia não conseguirá crescer de forma adequada, dificultando o desenvolvimento de longo prazo.
Outro ponto interessante de ressaltarmos é a relação entre o não crescimento da renda e o desenvolvimento econômico-social. Se a renda não aumenta, reflexo da ausência de um crescimento econômico sólido e significativo, então não parece haver grandes possibilidades de se planejar, ao longo do tempo, uma política social de distribuição de renda e melhoria das condições socioeconômicas da população, uma vez que a renda continuará, tudo o mais constante, concentrada, sem sobras ou espaços para que o governo consiga colocar em prática políticas públicas que favoreçam classes de menor rendimento. Nesse aspecto, uma economia que não cresce, e com os agravantes dos problemas brasileiros, pode ficar mais tempo com distribuição de renda distorcida e considerada pouco justa.
RENAN PIERI É preocupante. A renda está estagnada. Há menos renda e o acesso a crédito piorou bastante em relação a anos anteriores, então o consumo é baixo. Em um cenário com tantas incertezas, sobretudo em relação a uma possível reforma tributária ou um possível aumento de impostos no futuro, fica difícil investir. E sem investimento, você fica preso num ciclo de baixo crescimento.
A economia cresce pouco e, automaticamente, as empresas investem pouco. A renda permanece estagnada porque você tem um desemprego alto, então tudo isso converge para ficarmos em um patamar de crescimento baixo. Consequentemente, para destravar isso, precisamos fazer reformas, que é a única opção que temos. Aí entra a agenda que busca aumentar a produtividade: redução de burocracia, abertura econômica, reforma tributária. Enfim, temos que fazer alguma coisa nesse sentido.
JULIANA INHASZ O setor público sempre foi considerado um importante agente dentro do mercado, fomentando os investimentos, gerando postos de trabalho e, por consequência, renda e aumentos de produto. Se o setor público projeta queda de seus investimentos para 2020, há a percepção de que a participação deste agente na economia, impulsionando o crescimento econômico, será menor. Dessa forma, podemos esperar uma menor participação do governo no processo de retomada de crescimento previsto para 2020.
Neste caso, para que exista aumento significativo de crescimento econômico e, portanto, de renda, o país terá que contar com a participação intensa do setor privado, além do setor externo. Estes fatos levantam algumas preocupações, sobretudo quanto ao desdobramento do processo de crescimento em tais condições, uma vez que o setor externo tem se mostrado cada vez mais frágil em contribuir com a retomada do crescimento econômico brasileiro, e o setor privado doméstico parece não ter fôlego suficiente para conseguir aguentar, sozinho, a responsabilidade de fazer a economia brasileira voltar a crescer.
RENAN PIERI Historicamente, o investimento público tem caído no Brasil como proporção do PIB. Até 2018, o investimento total ficava em algo em torno de 16% do PIB, sendo que, desses, cerca de 2 pontos percentuais eram de investimento público. Ele já foi bastante importante, principalmente nos anos 1960 e 1970, mas hoje em dia ele é pouco relevante.
Acho que a principal notícia do orçamento de 2020 é que ele não para em pé: a margem é muito pequena para algum aumento de gastos, que sempre ocorre. Se houver qualquer revisão de crescimento econômico para baixo e a receita diminuir, o cobertor é curto e você já não tem dinheiro.
Uma vez que o orçamento não para em pé, vai ter que ocorrer um aumento de carga tributária ou aumento de dívida. Mas o aumento de dívida depende de aprovação no Congresso para algum crédito suplementar. Isso deixa o ambiente bastante confuso. Confusão e perspectiva de aumento de imposto significa pior crescimento para economia em 2020.
Fonte: Nexo Jornal
Tópicos relacionados
Comentários